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By terça-feira, agosto 30, 2011 , , ,

          O Trem.


Meu sorriso foi se aumentando quando o barulho do trem passou do lado de fora de minha janela. Esse tão conhecido barulho me fascinava, me trazia a realidade, o que eu precisava constantemente por viver em um mundo de sonhos onde eu deixava a minha imaginação solta para me surpreender.
O motivo de meu sorriso? O meu mais novo sonho. Eu iria sair daquele apartamento apertado, sim fugir de casa ir para aquela estação e pegar o primeiro trem que eu visse e ir para longe daqui. Seria a única vez que eu não escutaria o trem, pois afinal eu estaria dentro dele.
Eu corri para cama apertada e peguei meu diário de sonhos que ficava debaixo do travesseiro, lá eu escrevi com belas palavras esse meu novo sonho e no final eu escrevi para mim mesma nunca desisti desse sonho.
Eu o coloquei de volta ao lugar e o apartamento tremeu com o som de um novo trem, eu corri para janela para sonhar um pouquinho, imaginar para onde esse ia. Tantos lugares para ir, para onde esse estava indo? Quem sabe para a Irlanda? Ou um lugar mais mágico, como a terra das fadas... Nunca iria saber de verdade para onde o trem ia, queria estar nele e descobrir.
Ver com meus próprios olhos o mundo do lado de fora desse quarto, dessa prisão e me maravilhar com as coisas que veria, com as pessoas, as árvores, um sonho tão grande. Lembrar-me fez chorar, mas eu logo limpei as lágrimas e me pus a andar pelo quarto imaginando como seria o mundo lá fora, nem ligando para minhas meias coloridas que se sujavam no chão.
Arrastei as meias pelos mesmos lugares por varias vezes, como se fizesse de propósito, mas estava tão longe que não prestei atenção, o som de outro trem e a porta de casa sendo aberta me assustou me tirando do meu mundo seguro. Eu corri pra cama fingindo estar dormindo, mas não adiantou muito, ela veio e puxou as cobertas brancas encardidas E me puxou me fazendo cair no chão. E tudo começou de novo, todos os dias, não era minha culpa, mas era como se fosse, eu precisava sair daqui só não sei como e nem quando.
Doeu, sempre doía. Eu fui dormir chorando, como sempre e de manha assim que acordei anotei mais um pesadelo com ela, com a minha vida. Estava decidido eu irei embora para sempre e ninguém conseguiria me impedir. Ninguém realmente se importava, eu era só mais uma sonhadora que não era para existir.
Eu me levantei e andei pelo quarto pegando as coisas mais importantes para mim que tinham naquele quarto, o que não eram muitas e a maioria era papeis com sonhos escritos, eu coloquei tudo em uma mochila rasgada que peguei no quarto dela, a minha odiosa madrasta e depois de me arrumar mais ou menos olhando para o pedaço de espelho que só mostrava metade de meu rosto de cada vez.
Eu sai pela porta sem olhar para trás, sem ver o estrago que tinha feito na maçaneta e escutei pela ultima vez o barulho do trem passando e tive a certeza que nunca mais voltaria ali, e prometi a mim mesma que nunca mais sofreria nas mãos daquela mulher e nem de seu marido que um dia eu ousei a chamar de pai. As coisas em minha casa mudaram muito desde que minha mãe foi assassinada em uma tarde de sábado pelo meu pai enquanto eu cochilava meu quarto, ela tinha sofrido tanto que morrer foi à melhor coisa que a aconteceu, não a minha, claro porque só tinha cinco anos e ela me deixou para sofrer na mão da nova esposa de ‘papai’. Eu estava pensando nisso enquanto descia as escadas para a minha merecida liberdade que mesmo vindo tarde, não veio tarde demais.
Eu cheguei à porta do prédio e olhei tudo a volta daquele velho prédio, tudo parecia tão novo e tão pior, parecia que aquele verde de anos atrás, aquele brilho tinha desaparecido e isso me deprimiu. Continuei andando a procura da estação, as pessoas que passavam por me olhavam assustadas, não sei se era por causa da minha desleixada aparência ou pela mancha roxa que ela havia deixado ontem à noite em meu rosto. Não tinha um motivo, era a diversão dela.
De longe eu avistei a construção antiga e lotada e meu coração pulou em meu peito, eu estava a passos do meu sonho se tornar realidade e minha felicidade foi enorme, como não era há muito tempo. Mas eu não pude aproveitar sozinha essa felicidade.
Um menino esbarrou em mim e eu como não falava com ninguém a anos fiquei apenas o olhando e ele depois das milhões de desculpas se prendeu em meus olhos e nenhum dos dois quis desviar o olhar, ele estendeu a mão para mim se apresentando.
_ Olá me chamo Mark e você é...?
Fiquei sem o que fazer, não sabia se ainda conseguia falar, me forcei a colocar a mão sobre a dele, mas não apertei não tinha forças.
_Meu nome era Twinkie, mas minha madrasta não gostava dele e passou a me chamar de Nikkie. Não sei o meu nome de verdade.
_Como gostaria de ser chamada?
Isso me surpreendeu muito, nunca havia pensando em nada desse tipo antes, era diferente as pessoas pedirem a minha opinião. Eu olhei para estação ao longe pensando em um nome que eu gostaria, mas eu não achei nenhum. Eu havia gostado dele, mas queria chegar logo à estação estava com medo de nunca conseguir chegar lá, medo de não realizar o meu sonho. Eu dei de ombros para ele e acenei me dirigindo novamente pela rua rumo ao meu sonho.
Don’t speak” Sabia que não estava certo, escrever na mão de um estranho ‘não fale’ poderia ser ofensivo, mas ele entendeu de uma forma estranha.
Eu havia chegado finalmente e me maravilhei com as coisas lá dentro, o sorriso que abriu em meu rosto foi tão grande que fez o menino olhar para mim com curiosidade, ele gesticulou para uma cabine onde era o local onde se comprava passagens e eu o acompanhei segurando sua mão por medo de me perder, o lugar estava lotado.
Ele me segurou forte e me perguntou para onde eu queria ir e eu me forçando muito disse em voz alta:
_Para o céu. Para lugar nenhum.
A vendedora olhou para mim com um olhar estranho e ele riu, ele pegou duas passagens e me entregou uma delas, fiquei olhando para aquele tipo diferente de papel em minhas mãos, prestando atenção em cada detalhe memorizando cada letra e meu rosto foi coberto por lágrimas de felicidade, eu estava tão perto.
Estava a beira dos trilhos e olhava esperançosa para o começo deles, esperando o trem vir e me levar para bem longe daqui. Eu esperei e esperei, já havia se passado muito tempo e eu pensava que ele, o trem não viria porque sabia que eu estava aqui e não na janela como sempre e que por isso ele não iria me pegar e me levar para a terra das fadas, ou para Irlanda.
As lágrimas desceram novamente, dessa vez lágrimas de tristeza, me sentei no chão esperando que isso não fosse verdade e ele que se abaixou ao meu lado me abraçando e pedindo para que eu esperasse mais um pouco que ele viria.
Eu escutei o barulho, o famoso apito do trem e me levantei correndo e o vi de longe e o apito soou de novo eu limpei as lágrimas e olhei com fascino a grande locomotiva que passava por mim rapidamente fazendo meus cabelos voarem. O maquinista gritou e os passageiros entraram apressados para dentro do trem e eu fui puxada para dentro também.
Dentro do trem conseguia ser mais perfeito do que do lado de fora e eu estava amando cada segundo desse meu sonho se tornando realidade, eu me sentei na janela e ele ao meu lado e eu olhei para cada rosto de cada pessoa dentro do trem, aqueles que iriam para uma aventura junto comigo. Quando acabei, olhei para o menino, Mark que me olhava com um sorriso, o seu sorriso me fez lembrar minha mãe e de como ela adorava cantar musicas para mim e devagar eu fui lembrando as letras, das palavras, do som, da felicidade e das coisas como eram antes.
_Me chame de Ella.
Ele sorriu mais ainda e depositou um beijo em minha testa. Eu olhei para fora da janela e o trem começou a movimentar, o apito tocou novamente e eu me pus a imaginar para onde estaria indo, sonhando. Mas dessa vez eu saberia para onde ia, e o que me fez sonhar mais forte ainda e a ansiedade de descobrir logo tomou o meu corpo.
Eu finalmente consegui, eu realizei o meu sonho, e o barulho do trem passando encheu meus ouvidos de alegria e me fez novamente acreditar que as coisas poderia sim ficar bem.

* Mais um conto meu pela falta do que fazer, pela vontade de criar um novo mundo, pela insistência de minha imaginação que adora lançar ideias em minha cabeça. Como de costume eu não gostei desse conto, mesmo sendo eu mesma que tenha escrito, mas isso é normal, eu nunca gosto.
Hoje eu preciso ficar sozinha, preciso pensar. Me deixe fazer isso. 

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