Amor de final de semana .
Ela gritava em silêncio esperando que uma alma, qualquer uma, visse em seus olhos o desespero pelo afeto. Difícil não era a palavra certa, mas era a palavra que ela usava para qualificar tudo a sua volta, era muito difícil levantar da cama, muito difícil respirar e mais ainda sorrir no espelho. Mas ela tentava, incansavelmente. Mesmo que nunca parecesse o suficiente.
Ela vivia uma vida comum, esperando que algo extraordinário acontecesse, porque as histórias das princesas tinham que ter sido baseadas em algum lugar.
Quando ele chegou, o extraordinário não foi suficiente para descrever. Na fila do caixa do supermercado com aquele sotaque gostoso de ouvir, ele começou a falar com ela sobre marca de detergente e eles não pararam mais. Ela sentiu os seus pulmões se entupirem com o ar daquele supermercado todo e teve medo de soltá-lo e a mágica ir com ele, mas quando ele se inclinou para frente para dar um abraço de despedida, ela se sentiu perdida, entregue, e os braços fortes dele forçaram o ar para fora dela.
Ele ligou no dia seguinte, e ela ligou no próximo, marcaram encontros que duravam o dia inteiro e sonhavam a noite inteira com a possibilidade de se tornar mais do que uma canção de amor. Ela encontrou o abrigo nas conversas demoradas sobre política dele que na maioria das vezes ela nem estava prestando atenção, ele sentiu a necessidade de decodificar o mundo para que ela pudesse colocar a sua razão em tudo. E assim ele fez, ela parou de fingir que escutava.
Ela se apaixonou assim, de primeira vista, mesmo isso sendo apenas uma lenda, mas ele não. Não porque não queria ou não precisasse, mas porque não podia. Ela xingou dos deuses ao capeta e colocou o destino na cruz por te dar o gosto do perfeito e arrancar antes da primeira mordida. Não parecia e não era justo.
Ele não podia porque não sabia se pertencer a uma pessoa só, isso o matava de medo, ter que se tornar dois, ele amava a liberdade de deixar de tomar decisões importantes. Eles se tornaram aquela paixão de final de semana, sem correntes, com silêncio de dias e amor de horas, mas para ela não existia opção a não ser amar ele, mesmo que não fosse o conto de fadas que ela queria, era suficiente.
Porque quando se beijavam, por mais automático que fosse o beijo, ela sentia as suas almas se tocando e brincando de se amarrar. Ela sentia todas as células do seu corpo clamando pelas dele, ela queria e precisava do seu toque, do seu aperto, do seu cheiro e principalmente do seu beijo. Beijo esse que mudou tudo, que o fez passar a noite uma vez e acordar maravilhado pela calma da respiração dela, pelo jeito que a sua pele pálida brilhava na luz do sol fraco, pelo jeito que a sua boca mexia como se estivesse tendo conversas maravilhosas em seu sonho, a simplicidade dela de ser ela o fez mudar.
Ela arrancou todas as camadas de mágoa e tristeza do passado dele como se descascasse uma mexerica, substituiu cada semente de medo por gominhos doces de felicidade e ele a odiou por ser ridícula e o comprar com uma fruta, mas a amou por lhe salvar.
Eles brigavam entre os minutos e se amavam entre as horas. Ele era cínico e malandro, ela era fofa e carente. Todos achavam que ela não merecia ele, que ela conseguiria alguém que a tratasse melhor, a chamavam de mulher de malandro, mas não era assim. O amor que surgiu nas entrelinhas não era simples, não era preto e branco e eles amavam todas as cores que emanava daquele amor errado, desproposital, malandro e perfeito da sua própria maneira. Os finais de semana não conseguiam mais suportar a necessidade de ser dois, e eles se deixaram entregar, nada mais era difícil.
Ele se ajoelhou na frente dela, finalmente, como se fosse fazer uma oração, e pode se considerar que ele estava sim rezando, estava agradecendo quem quer que seja por ter a colocado na sua frente na fila do supermercado. Ele escolheu a acorrentar pelo para sempre, ele escolheu a amar com todas as forças possíveis e ela escolheu ser a mulher daquele príncipe fantasiado de malandro.
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